* Prof. MsC. Romário Milhomem da Cruz
Ao estabelecer
contato com a longa metragem ‘Matrix’, observamos que esta produção
cinematográfica apresenta-se como uma versão moderna do famoso mito platônico
da Alegoria da Caverna. Um pouco mais de dois milênios, e esta obra se mostra
muito influenciada pelo pensamento platônico acerca da realidade e o
conhecimento.
Em ambas as obras (o
Mito da Caverna e o filme Matrix), se tem a possibilidade de encontrar as
mesmas questões sobre as percepções de mundo geradas como sombras à nossa
imaginação, e a realidade presente por traz delas. Morpheus, um dos personagens
do filme, evidencia essa questão ao questionar: “como saberias a diferença
entre o mundo dos sonhos e o mundo real?”.
Dentre as pistas da
metáfora em torno do filme Matrix, podemos destacar a questão do indivíduo
diferente, que tem uma nova forma de se relacionar com as percepções, esse é um
novo sujeito, que rompe com as sombras do conhecimento e alcança à plenitude,
esse sujeito é representado pelo personagem principal da trama, o Neo.
Podemos comparar esse
personagem do filme com aquele indivíduo do mito que se encontrava na mesma
caverna das demais pessoas, na qual podemos considerar no filme como a empresa,
o apartamento, os moldes sociais, a cidade e tudo que o Neo possuía, como
realidade construída. De repente perceber que o seu cotidiano não era real, e
que haveria um mundo externo de sua caverna, por maior loucura que ele pudesse
achar, era como se libertar de amarras, assim como o sujeito que se liberta da
caverna e passa ver as reais figuras por detrás das sombras.
Percebemos que em
ambas as representações do mesmo pensamento platônico, encontramos indivíduos
que se encontram amarrados de sua tenra idade, em direção oposta à entrada da
caverna, obrigados a contemplar sombras por toda a sua vida. Esta amarra, no
filme se deu pela dormência de uma realidade implantada em sua mente, ao passo
que na realidade os indivíduos não passam de meras baterias humanas em
capsulas.
Essa representação da
realidade mostra uma crítica à sociedade que passa sua existência contemplando
apenas as sombras das representações de outros homens que projetam a sua
realidade e o eco de suas vozes, mas são incapazes de buscar outra realidade
social.
Esta analogia,
presente desde o início do filme, apresenta-se quando os personagens ficam em
conflito com o mundo real e o mundo simulado. O fato do seu mundo ‘ser’ uma
programação realizada pela inteligência artificial de maquinas, como uma forma
de manter estes em controle e permanecer fornecendo energia, dar-nos a ideia da
mesma experiência vivenciada na Alegoria da Caverna.
Assim, Matrix e o
Mito da Caverna contêm e sua essência, a ocultação da força original que
desenvolve a realidade, deixando os sujeitos cegos para a verdade por detrás
das sombras, tornando-o escravos das representações que lhes são fornecidas.
Percebe-se que nestes
cenários, as aprendizagens obtidas pelos nossos sentidos nem sempre refletem a
realidade. Platão pensou o mundo sensível como um mundo perecível, em constante
transformação, irreal, apenas uma pequena projeção obtida a partir do mundo
verdadeiro.
Ao se libertar das
sombras, tanto Neo (matrix) como o sujeito que se liberta na Alegoria da
Caverna, alcançam a cura de ignorância a respeito de sua existência e da
verdade por detrás das sombras. E esse caminho de libertação gera um sentimento
expresso por Neo, quando diz: “Alguma vez tiveste aquela sensação em que não
tens a certeza se estás acordado ou a dormir?”
Assim, para encerrar
esta análise, podemos concluir o pensamento platônico por meio do
questionamento realizado por Morpheus (matrix): “O que é ‘real’? Como
definirias ‘real’? Tens vivido num mundo de sonhos, Neo”. Platão viu que os
sujeitos que conseguem fugir deste mundo das representações, ficaram ofuscados
com a própria luz, mostrando que esse processo de iluminação dos pensamentos
não é uma tarefa fácil, que requer um processo de adaptação, principalmente
para os que se libertam da matrix pela primeira vez.
Referências:
PLATÃO.
A República. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbekian. 1990, 6ª ed.
THE MATRIX, (Matrix). Direção e roteiro: Andy Wachowski e Larry Wachowski,
produção Joel Silver, Distribuição: Warner
Bros. EUA, 1999.